quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Saudade

Nunca havia sentido seu rosto tão de perto. Nem você nunca tinha tocado o meu com sua tão incrédula mão. Mas sempre há tempo para novas sensações e novas intensidades. Desejo cegamente que o tempo afaste seus braços de mim e que eu nunca mais seja forçado a sentir a força do seu repugnante beijo. Espero piamente que você perca meu endereço, que esqueça a minha imagem e nem seja capaz de reconhecer meu cheiro. A cada manhã deixo uma carta de despedida com seu nome sobre a mesa da nossa cozinha. E mesmo assim você não se vai. Já não me destruo por sua conta, nem me desespero com sua presença, no entanto, não te amo e tudo o que mais quero é ver sua partida e deixar escapar por entre meus lábios escancarados um liberto adeus.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

A 3

Simples noite, que eu nunca vi tão simples. Céu estrelado e ofuscado pelas poucas luzes da cidade distante do grande. Paralelos pouco paralelos, mas resistentes a evolução e ao modernismo. Silêncio quebrado apenas pelos espirros espalmados e escandalosos do homem da madrugada. Escandalosos também eram nossos sorrisos pelo meio exato da rua, sobre as calçadas e as margens da praça. Aliás, por aqui, não é preciso muito esforço para fazer de algo um escândalo. Mas foi tão calmo, tão espontâneo, tão casual. O tempo, que consegue bravamente polir os paralelos do início desde, consegue fazer com que nós, mesmos isolados geo-sentimentalmente, permaneçamos muito parecidos com o que éramos antes e que mesmo quando o objetivo é lançar na roda as mudanças tecidas, o jeito de desenrolar a narrativa não consegue ser tão distinta. Que bom que é assim. Que bom que eu sei que é pra vida toda. Que bom que o tempo nos permite.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Correspondência

Vento leve, que toca minhas palavras, apelidado pelo último poeta, de brisa, e que desfaz os limites propostos pelo litoral, leve até meu amor essas minhas palavras de paixão, um pedacinho dessa minha saudade e uma medida certa do meu perfume.
Águas límpidas transparentes, que escorrem pelas beiradas dessa natureza construindo seu percurso próprio e finito ao mar, escoe até meu amor um pouquinho de minha poesia e minhas palavras embriagadas de tanto sentimento.
Folhas desvirginadas desse meu caderno com linhas azuis anis, guardai sinceramente as palavras que a vós confio, sem desvio ou descrença, sem maldade ou exagero, e entregue um dia, aos olhos recém-chegados do meu amor, sem deixar de se esquivar das lágrimas que possam lhe atingir.
Tempo, fazei com que lhe haja, para que todo meu esforço não se perca em si.

sábado, 3 de janeiro de 2009

No Ponto

Se o tempo é novo, eu continuo o velho. Meus sonhos ainda são os mesmos, meu dom não mudou, minha voz ainda canta feliz sem parar, minha pele continua branca e meus cabelos negros encaracolados. Há quem diz que eu continuo bonito, mas eu acho que eu continuo exótico. Ainda escrevo poesias que tocam seu coração, tomo banho no chuveiro e vejo a sujeira da minha alma escorrer pelo ralo, sorrio pra todo mundo que merece esse brinde e ainda amo meus amigos. Continuo desejando mais de você: mais beijo, mais voz, mais gemido, mais líquido, mais carinho, mais presença, mais amor. Ascendo e apago. Entro e fecho. Crio e destruo. Realmente, aqui nada é novo, mas tudo é do jeito de deve ser.

Neo

Eu fechei os olhos, senti uns abraços fortes, ouvi o barulho de uma tampa indo pro ar e quando me dei conta, era ano novo. Pra eles, não pra mim. Para mim cada dia é dia novo, sem marcações, sem delimitações, sem datas certas. Eu sou assim: sem marcações, sem delimitações, sem datas certas pra ser feliz. Meus sonhos não podem esperar uma virada de ano pra começarem realizar. Nem tenho paciência pra esperar um ano inteiro e somente então desejar aos meus amigos a tão velha falsa saúde e aquela mecânica paz. Pra mim é tudo novo, em todos os dias e em cada começo. E eu sempre recomeço: sem medo, sem desespero, sem desprezo. A vida tem que ser um eterno ano novo, com fogos, sonhos, declarações, lágrimas, encontros e felicitações. Pobre daquele que vive o passado de um tempo passado, ou a tentativa frustada de um presente similar àquele que já se foi. Se pela primeira vez ou de novo, o que realmente importa é ser novo!